quarta-feira, 4 de junho de 2008

Gânsgster Van-Goghiano

Encontrei-o no metrô e já estava faltando um pedaço da orelha. Bem aqui, sabe, no altinho. Aqui ó: nessa parte durinha. Havia um corte diagonal, perfeito, e faltava um pedaço no alto. Arriscaria dizer que levaram embora um quarto da sua orelha, não sei não. O homem tem cara de quem usava um piercing ali, uma argola, um brilhante, mas agora não pode mais usar. O talho era perfeito, reto, profissionalmente cirúrgico, parece que foi feito com uma serra elétrica de fatiar o pernil de Natal. Quando o encontrei ele estava de pé, parado na porta do trem com o olhar fixo nas coisas que passavam velozes do lado de fora. Todos ali ao redor olhavam curiosos a sua orelha sem pedaço e reconstruíram em silêncio um filme privado na mente. Talvez ele já tenha nascido assim, mutação genética mesmo. Ou então o piercing que usava na orelha inflamou, cancronou e tiveram que arrancar o pedaço zuado. Para boxeador o sujeito não tem porte e dizer que morderam um pedaço da sua orelha no ring não convence. A autopenitência ao cortar a própria orelha como Van Gogh, é possível, não descarto. Mas se tenho que escolher, de todas as possibilidades narrativas fico com o filme de gânster e na minha tela gigante (wall to wall) esse personagem é ligado à Camorra e aquilo ali foi tortura...

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